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- Palestra de Gustavo Brigagão sobre Tributação do Século XXI
- Encerramento do seminário, por Victorio De Marchi
Palestra de Gustavo Brigagão sobre Tributação do Século XXI 345z62
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O advogado, professor de direito e presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF), Gustavo Brigagão, falou sobre ado e futuro da tributação. Ele traçou um breve panorama histórico das escolhas feitas pelo Brasil em matéria tributária e dos reflexos que elas produziram em termos de insegurança jurídica. Em seguida, tratou dos novos desafios que o mundo enfrenta no campo da tributação.
“Nosso sistema tributário é de 1965, num mundo que era completamente diferente”, lembrou. “As mercadorias eram bens corpóreos que circulavam entre a indústria, o atacado e o varejo, até chegar ao consumo. O serviço era resultado de uma atividade humana, necessariamente.”
Naquela época, segundo ele, enquanto a maioria dos países caminhava na direção de um imposto nacional sobre valor agregado, o Brasil optou por criar impostos distintos para cada ente federativo – o IPI, federal; o ICM, depois ICMS, para estados; e o ISS, municipal. Na avaliação de Brigagão, essa escolha gerou muitos dos problemas jurídicos que surgiriam nas décadas seguintes, conforme a economia ia se tornando mais complexa e as unidades federadas avam a disputar o direito de tributar as novas atividades que iam surgindo.
Ele citou vários conflitos e suas idas e vindas pelos tribunais, como a distinção entre mercadoria e serviço, a caracterização do local de prestação dos serviços e a definição de insumos. Depois, apresentou uma longa lista de novos desafios que os países estão enfrentando em virtude da globalização e da revolução tecnológica das últimas décadas. “Essas novas tecnologias tornaram o sistema tributário, não só o brasileiro, mas o sistema tributário internacional, caótico”, comentou.
Segundo ele, inovações como e-commerce, cloud computing, internet das coisas, impressão 3D, de softwares, serviços de streaming, aluguel de imóveis por aplicativo, venda de dados sobre consumidores, publicidade digital e criptomoeda trouxeram uma série de desafios tributários que ainda não encontram respostas satisfatórias em nenhum lugar do mundo. “Hoje, a mercadoria pode ser vendida através de um e-mail. E a impressão é feita na casa do consumidor. Ou seja, a cadeia que existia de circulação de mercadorias, ela a a ser uma cadeia de valores”, afirmou.
Para dimensionar o tamanho desses negócios, lembrou que as cinco gigantes da tecnologia que compõem o acrônimo GAFAM (Google, Amazon, Facebook, Apple e Microsoft) faturaram 767 bilhões de dólares em 2017. “Isso equivale ao PIB da Suíça”, comparou.
Brigagão destacou três características específicas desses negócios que impõem grande dificuldade à sua tributação: não precisar de presença física no país de prestação do serviço; ter a maior parte do seu valor concentrada em ativos intangíveis; e gerar receita a partir do próprio usuário. “O fornecimento de dados desses participantes cria um valor que faz com que essas empresas em a valer bilhões. Seja através do uso que eles fazem desses dados, seja através da propaganda, do nível de público que o marketing dessas empresas consegue atingir”, explicou.
Ele fez um relato das iniciativas que vêm sendo estudadas ou propostas por organizações como a OCDE, o G20 e o Conselho Europeu e iniciativas adotadas recentemente por países como França, Espanha e Reino Unido para tributar esses novos negócios. Mas ressaltou que elas ainda não apontam em uma direção clara sobre a melhor forma de tributar essas empresas.
Brigagão falou também sobre as dificuldades que as empresas globais têm em entender o sistema brasileiro e fez uma avaliação sobre as propostas de reforma tributária em discussão hoje no País. Defendeu a adoção do IVA para resolver alguns dos principais problemas do modelo atual, como a sua complexidade e cumulatividade, e lembrou que ele é adotado por 165 dos 193 países do mundo. Mas considerou inadequada e possivelmente inconstitucional a forma como é proposto na PEC 45.
Ao final da palestra, o tributarista Everardo Maciel, coordenador do Seminário, reforçou os pontos trazidos por Brigagão sobre os desafios que os países enfrentam para tributar os gigantes da tecnologia. No entanto, apresentou ponto de vista contrário à adoção do IVA, por considerá-lo um tributo do ado, sem deixar de reconhecer os problemas do sistema atual. “Nós estamos discutindo a solução de 1949 para o século XXI”, observou.
Brigagão concordou com a obsolescência do IVA, mas reforçou sua crítica ao caráter cumulativo da tributação nacional e voltou a defender sua adoção resolver problemas que afetam o desenvolvimento do Brasil. ”Eu gostaria muito de poder dizer a investidores estrangeiros que nós temos uma forma de tributação que é compatível com aquilo que eles conhecem. E hoje eu não consigo dizer isso”, lamentou.
A seguir, a transcrição da palestra:
Continuar...Palestra: Segurança Jurídica e a Tributação do Século XXI
Palestrante: Gustavo Brigagão
Currículo (jun./19): Presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF); membro do comitê executivo da International Fiscal Association (IFA); vice-presidente do Fórum Permanente de Direito Tributário da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ); diretor de relações internacionais do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (CESA); coordenador do grupo de trabalho “ICMS” da Comissão de Reforma Tributária do Estado do Rio de Janeiro; professor na pós-graduação da FGV-RJ; e sócio do escritório Brigagão, Duque Estrada – Advogados.
Transcrição da palestra
Boa tarde a todos. Eu queria agradecer ao meu querido amigo Everardo e ao Edson pelo convite. Eu não vou fazer como fez o Heleno de me oferecer para sentar aí, porque eu não sou bobo de entrar no debate com você. É de uma lógica irritante.
Mas, hoje de manhã, porque o meu tema, como os senhores veem: Segurança Jurídica e Tributação no Século XXI. Hoje de manhã, eu ligo a televisão às 6 horas da manhã e está o Fachel e o Octavio Guedes. E eles começam a discutir sobre essa questão da PEC da Previdência, que vai ou não ser votada no dia 18 de julho. Ai o Fachel se vira para o Octavio e diz assim: “O que você acha que vai acontecer? Quais são as suas expectativas, qual é a sua previsão em relação a isso?”
Ele diz: “Eu não faço qualquer previsão a longo prazo. Para mim qualquer coisa que seja superior ao meio dia do dia seguinte é longo prazo.”
Imaginem, senhores, a minha situação de ter que falar como vai ser a tributação no século XXI.
Aqui, em relação ao que nós temos de normas vigentes, nós temos normas que não são compreensíveis, que não são estáveis e que não são previsíveis. Então nós, definitivamente, de acordo com a lição que nós tivemos aqui com o professor Humberto, nós temos a certeza de que não há segurança jurídica no sistema brasileiro.
Mas, para entender o século XXI, nós temos que ver o século XX, até porque nós estamos presos a ele. Por que estamos presos a ele? Nosso sistema tributário nacional é de 1965, num mundo que era completamente diferente, um mundo em que as mercadorias eram bens corpóreos que circulavam entre indústria, o atacado e o varejo, até chegar ao consumo. O serviço era resultado de uma atividade humana, necessariamente.
Naquela época, nuvem era para fazer chuva, não guardava arquivos. O homem não tinha ido a Lua, televisão era preto e branco. Era um mundo completamente diferente.
O IVA acabava de ser criado na Europa e também no Japão, fazendo uma oposição contra uma tributação cumulativa que imperava à época, e nós, aqui no Brasil, num regime de exceção, criamos uma tributação que era única no mundo.
Nós espraiamos na competência federal, estadual e municipal a tributação sobre indústria, mercadorias, comércios e serviços entre três tributos. O IPI, o antigo ICM e o ISS. Criamos essa tributação cumulativa e muito afeita a conceitos.
Conceitos esses que no decorrer do tempo foram trazidos ao Supremo Tribunal Federal por estados e municípios, no intuito de trazer para dentro desses conceitos determinadas atividades que não estavam contidas nele. E o que fez o Supremo? Ao julgar questões relativas aos estados, ele elasteceu o conceito de mercadoria. Deixou os estados satisfeitos com o resultado, porque viram a sua competência ampliada.
Mas no momento em que essa competência foi ampliada, na verdade, a competência dos municípios foi diminuída, porque no momento em que ele amplia o conceito de mercadoria ele diminui o conceito de serviço. E quando foram trazidas questões relativas ao conceito de serviços foi feito o mesmo, houve uma ampliação desse conceito e a correspondente diminuição do conceito de mercadoria.
Então, ao invés de consertar o problema, nós tivemos o Supremo Tribunal Federal agravando esse problema. Criando uma zona de interseção em que cabem os dois conceitos. Essa é a pior reforma tributária que pode existir. É a reforma tributária feita pelo Supremo Tribunal Federal. São onze pessoas que não foram eleitas pelo povo. Que não têm representação para isso.
Então, surgiram conflitos de três níveis: Conflitos de competência, conflitos entre ICMS e ISS – são os conflitos mais tradicionais, vamos dizer assim. Conflitos entre IPI e ISS. Afinal, os serviços são considerados mercadorias? São considerados industrialização? Podem ser considerados industrialização ou não? A industrialização por encomenda gerou um contencioso e decisões contraditórias que todos os senhores conhecem. Conflitos de competência entre os próprios estados. No que diz respeito à incidência do ICMS na importação, se é realizada na entrada física, se é realizada em relação ao local onde está quem negocia, o importador jurídico. Questões relativas a ISS. Essa foi uma das piores, não é? Local da prestação. Que gerou decisões judiciais para todos os lados. Jurisprudência para todos os lados.
Nós tivemos o conflito na jurisprudência, a que o Hamilton Dias de Souza fez referência há pouco. Aqui, eu destaquei alguns: Cofins – sociedades profissionais, que todos nós aqui que somos sócios de sociedades prestadoras de serviço fomos vítimas. Nós tivemos uma súmula do STJ, que era favorável à não incidência desse tributo, depois veio o Supremo e decidiu o oposto. Depois de anos, decidiu o oposto e sem modular efeitos. Gerou exatamente o efeito a que se referiu o Professor Humberto.
O IPI alíquota zero/isenção. Primeiro, diz-se que é possível o creditamento nas aquisições isentas. Depois estende-se, equivocadamente, a meu ver, essa possibilidade de crédito para alíquota zero. Depois, a jurisprudência volta, tira a alíquota zero, depois tira a isenção. Vai e volta. E depois estende ainda mais a discussão do tema, pela decisão recente da Zona Franca de Manaus, e diz que para a Zona Franca de Manaus vale.
Substituição tributária para frente, que foi referida pelo Hamilton há pouco. Créditos de PIS e COFINS. Conceito de insumos… Com insumos já teve todos os possíveis conceitos. Seja na jurisprudência do CARF, seja na jurisprudência do STJ. E a última decisão do STJ não foi suficiente para sanar o problema. Vieram pareceres COSIT dizendo, tentando interpretar aquilo de toda forma. É nesse mundo que vive o contribuinte no século XXI, mas por problemas criados no século XX.
Conflitos entre poderes. Basta ver uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que seja favorável ao contribuinte, logo em seguida vem o Poder Legislativo e diz o oposto através de uma PEC. Isso aconteceu exatamente com a questão do crédito, da possibilidade de crédito de ICM ainda, nas aquisições isentas, a Emenda os Porto, Emenda 23/83.
O IPTU progressivo, que o Supremo disse que seria contrária ao sistema jurídico brasileiro a possibilidade de progressividade no IPTU. No entanto, ela se tornou possível através dessa PEC [EC 29/00].
A Emenda 33/01: ICMS na importação por pessoas físicas, que foi julgado inconstitucional pelo Supremo e foi itido pela PEC 33.
E a Emenda 42/03, que me lembra o meu eterno guru Condorcet Rezende, que foi o Fundo de Combate à Pobreza, que foi declarado inconstitucional em relação às regras do Rio de Janeiro e que foi tornado constitucional pela Emenda 42. O Condorcet dizia que era a Emenda Lázaro. Que ela ressurgiu das cinzas.
Enfim, essa é a situação em que nós nos encontramos. E o que que houve de novidade para agravar essa questão? E aí nós estamos entrando, já saindo do século XX e entrando no século XXI, ainda no que diz respeito às questões nacionais, porque eu dividi a minha palestra em duas etapas. Uma para tratar do tema nacionalmente, quais são os problemas que nós temos aqui, e como eles estão sendo vistos também no exterior. E a perplexidade não muda tanto.
O que que nós temos hoje? Uma globalização absoluta, não é? Nós vemos aqui nesse mapa-múndi, nós vemos na fabricação de um simples frasco de Nutella, quantas instituições essa industrialização envolve. Onde está a sede da empresa. Onde estão os principais fornecedores, os estabelecimentos fornecedores. Onde estão as fábricas. Onde estão escritórios de venda. Repare que o Brasil está lá, em Poços de Caldas, fornecendo uma das matérias primas que participam dessa industrialização.
Em segundo lugar, o que que nós tivemos? As novas tecnologias. Essas novas tecnologias é que tornaram o sistema tributário, não só o brasileiro, mas o sistema tributário internacional, caótico. Por quê? O que que nós tivemos? Em primeiro lugar: cloud computing. Nós temos o service, o softwares as a service, o platforms as a service, o infra-structures as a service. Que são operações que são realizadas em um mundo absolutamente virtual e cuja competição pela tributação dessas operações é feita exatamente pelos estados e municípios.
Nós temos o e-commerce. O streaming. Internet das coisas. A impressão 3D. Que muda completamente o mundo que nós vivíamos quando o sistema tributário nacional foi criado. Naquela época, como eu disse, a circulação da mercadoria, ela era feita da indústria, do atacado para o varejo e para o consumidor final. Hoje, a mercadoria é vendida ou pode ser vendida através de um e-mail. E a impressão da mercadoria é feita na casa do consumidor. Ou seja, a cadeia que existia de circulação de mercadorias, ela a a ser uma cadeia de valores.
O blockchain, as criptomoedas, que nós não conseguimos nem definir a natureza dessas criptomoedas. A economia compartilhada. O AirBnb e o Uber. Na verdade, eles não têm um automóvel. Eles não têm um hotel. Eles são a maior empresa nessas duas atividades, nesses dois ramos.
Com isso, surgem cinco grandes empresas, que são apelidadas por GAFAM, que é o Google, a Amazon, o Facebook, a Apple e a Microsoft. Essas empresas faturam 767 bilhões de dólares em 2017. Isso equivale ao PIB da Suíça. O somatório do faturamento dessas cinco empresas.
Quais são as marcas dos negócios, no modelo de negócios seguido por essas empresas?
Primeiro lugar: ausência de presença física. Essas empresas atingem mercados independentemente de terem um estabelecimento físico no local onde esses mercados estão.
Segundo lugar: os ativos dessas empresas são predominantemente intangíveis. Eles trabalham em propriedade intelectual. Eles trabalham por meio de licenciamento do direito de uso da propriedade intelectual que lhes pertence.
E um tema, a terceira marca, que é fundamental, que hoje em dia se encontra em plena discussão em todos os foros relativos a essa matéria, que é a participação do usuário. O usuário na relação que mantém, na relação digital que mantém com essas empresas, com a maior parte dessas empresas, o fornecimento de dados desses participantes cria um valor que faz com que essas empresas em a valer bilhões. Seja através do uso que eles fazem desses dados, seja através da propaganda, do nível de público que o marketing dessas empresas consegue atingir. Essa é a situação em que nós estamos com o mundo digital. Como ele exige.
E o que que fez a legislação brasileira? O que que houve na legislação brasileira? Uma tentativa ininterrupta de estados e municípios tentando tributar essas operações. Porque, muitas das vezes, elas se encaixavam tanto no conceito de mercadoria quanto no conceito de serviços.
Eu trouxe três exemplos aqui. ou computação em nuvem. O Estado de São Paulo considera que seria tributado pelo ICMS. O Município de São Paulo diz que essa tributação seria dos municípios.
O Streaming. A Lei Complementar 157 de 2016 indica em um dos seus itens o serviço de disponibilidade sem cessão definitiva de conteúdo de áudio e vídeo, que é o streaming. A posição inicial do Estado de São Paulo foi no sentido de que o streaming deveria ser tributado por ele. Depois isso modificou.
Em relação à veiculação de publicidade e propaganda. Lei Complementar 157 diz que a inserção de textos, desenhos ou materiais em qualquer meio seria tributável pelo imposto municipal. O Estado do Rio de Janeiro ingressou com uma ADI, dizendo que isso aí é competência estadual.
Então, o que nós temos em âmbito nacional é um absoluto conflito de competências. Por quê? Porque esses conceitos, na forma em que criados em 1965, eles não se adequam mais a essa nova realidade. Porque na verdade nenhum desses bens se enquadra nem no conceito de mercadoria, nem no conceito de serviço.
Como diz Alberto Xavier: “O fato de existir capacidade contributiva que decorra do exercício dessas atividades não é suficiente para que essas atividades sejam tributadas. Há que haver uma previsão legal no sentido de que essas atividades devem ser tributadas.” Não é o Supremo Tribunal Federal quem vai, por meio do ativismo judicial que lhe é peculiar, estender conceitos que foram originariamente criados para uma outra situação, para tentar fazer com que as normas alcancem aquelas atividades que não estão sendo alcançadas pela tributação.
Eu concordo plenamente que nenhuma atividade, nenhuma circulação de riqueza deva estar fora do âmbito de incidência de qualquer tributo, mas que isso seja feito pelo poder correto. Pelo meio correto. E esse meio correto é através da legislação. Se houver competência designada para tanto pela Constituição Federal. E isso não existe.
Isso gera, como já foi dito aqui, litígios na ordem de R$ 3,3 trilhões. O Brasil é um recorde de contingência. Eu estou vendo ali o Antonio Marcos, ele certamente pode confirmar. Ele é jurídico da IBM. Normalmente, um grande grupo empresarial, quando ele vai fazer a sua comparação de receitas provenientes de atividades realizadas no Brasil com as dos demais faturamentos no resto do mundo, não estou dizendo que seja o caso específico, mas, muitas vezes é, o faturamento brasileiro corresponde a 2%, 3%. Ínfimo em relação ao resto do mundo.
Mas, no entanto, quando nós vamos ver o percentual de contingências de contencioso tributário, eles são campeões. São 95% do total de contingências do grupo inteiro. Qual o investidor que virá ao Brasil nessas circunstâncias?
Restrições indevidas à não cumulatividade. Multiplicidade de incidências sobre as mesmas bases. Guerra fiscal. Desequilíbrio fiscal que gera aumento de carga. Eu não vou entrar nisso porque isso já foi bastante abordado aqui nas brilhantes apresentações anteriores.
Vamos entrar agora no plano internacional. Nós vimos o plano nacional. Vamos ver o plano internacional. O que que nós temos no mundo? Aquele IVA que nasceu lá em meados do século XX se transformou nisso aqui. Na verdade, esse é um mapa-múndi do Fundo Monetário Internacional. Ele está desatualizado, porque aqueles países ali da África já têm IVA ou estão em fase de implementação, Angola está em fase de implementação e o Oriente Médio já tem IVA. Então, na verdade, o mundo seria mais colorido ali.
Então o que que nós temos? Ali estão as datas. As cores são relativas ao momento em que o IVA foi instituído em cada parte desse mundo. São 165 países que adotam o IVA. O IVA tem uma série de defeitos e o nosso querido Everardo Maciel, tenho certeza que ele vai fazer alguma pergunta a mim relacionada a isso. São 165 países.
Ontem, em um evento, eu estive com o professor Schoueri e ele fez uma pergunta. E nessa pergunta ele adotou como pressuposto o fato de que o investidor, quando vai investir em um país, ele quer saber se ele entende o tributo que incidirá sobre as operações dele. Ele entende o IVA.
Quando ele chega aqui o que que ele vê? Ele vê IPI, ICMS, ISS. E pior: quando nós vemos esse segundo mapa-múndi aqui, que é fornecido pela Ernst & Young, nós vemos que, ali, reparem os senhores, o verde é o que permite, possibilita que o tributo que é arrecadado nas cadeias anteriores seja reembolsado, por meio de créditos, obviamente, pelas técnicas da não cumulatividade ao contribuinte. O amarelo é o “full carry forward”, ou seja, aqueles países que empurram com a barriga esse refund. E o azul seria o “limited carry forward”, ou seja, aqueles que empurram mais ou menos. Olha a cor do Brasil: [amarelo].
Ou seja, nós não temos IVA no direito brasileiro. Nós não temos IVA. Com todas as questões relacionadas à não cumulatividade, com essa briga do conceito de insumos em PIS e COFINS, com as questões, com os cerceamentos que existem no creditamento. Seja de IPI, que não pode, por exemplo, não existe a possibilidade de creditamento em relação à aquisição de bens do ativo. Seja os cerceamentos que existem em bens de consumo para o ICMS. Seja a impossibilidade de retorno do ICMS que é devido em caso de exportação. Isso nos faz estar classificados ali. Com esses impostos que existem atualmente. No amarelo.
O que que o investidor tem que fazer? Inserir o valor dos impostos indiretos, não cumulativos, como custo e como aumento do seu preço, tornando o Brasil extremamente não competitivo. Reparem os senhores: os créditos que são lançados na contabilidade, as empresas de auditoria mandam retirar do ativo, porque eles sabem que eles jamais serão devolvidos ao contribuinte. Isso é que é o pior de tudo.
E aí, nós tivemos, em relação a essas novas tecnologias, nós tivemos o início da prática de planejamentos fiscais considerados extorsivos. Então, considerou-se que os contribuintes eram extremamente arrojados. Enquanto no Brasil nós temos o contribuinte acuado, no exterior nós temos os contribuintes arrojados.
E eles começaram através da exploração de uma série de lacunas normativas, como a má utilização do conceito de residentes. A utilização, por exemplo, o Estados Unidos determina que o contribuinte, para que ele seja considerado residente lá, ele tem que instituir, criar, incorporar a sua empresa em território americano. Enquanto na Irlanda eu tenho que ter a istração da empresa localizada lá. O que que as empresas começaram a fazer? Colocam a istração nos Estados Unidos e incorporam a empresa, criam a empresa na Irlanda. Então eu não sou considerado residente em lugar algum.
Ou então eu tenho a fragmentação de atividades que seriam propícias à caracterização de estabelecimentos permanentes. Todos os itens que são necessários para a caracterização de um estabelecimento permanente, eu retiro um desses itens e coloco o restante dos itens em um país e esse item faltante em outro. Então eu não tenho estabelecimento permanente nem em um lugar nem em outro.
Transferência artificial de lucros para as jurisdições com baixa ou nenhuma tributação. Isso gerou uma insatisfação generalizada no mundo inteiro. Ninguém aceitava mais isso a ponto de uma parlamentar do parlamento inglês se virar para um da Google e dizer: “Eu não acusando o senhor de cometer ilegalidades, eu estou acusando o senhor de cometer imoralidades”. Pelo fato de ele fazer esse tipo de operação e disso decorrer no pagamento de tributos em lugar algum. Pelo princípio da solidariedade, ele deveria pagar tributos sobre as operações que realiza.
Aí criou-se, em relação a essa nova economia surgida, a economia digital, criou-se a intervenção de três órgãos basicamente: da OCDE, da União Europeia e do G20. Eu vou citar aqui, brevemente, como se deu a discussão nesses três âmbitos.
Primeiro lugar, OCDE. A OCDE quando viu esse cenário criado por esses planejamentos extorsivos, criou um plano de ação que seria composto por quinze ações, que basicamente abordariam questões relativas à coerência, à substância e à transparência das relações jurídico-tributárias. Criou quinze ações.
Plano de ação número 1: as operações digitais. (As demais diziam respeito a um daqueles três enfoques que poderiam ser dados às questões relativas a esses planejamentos fiscais.) O que se disse no Action Plan One? A economia digital, ela não é uma economia que deva ser vista à parte. Ela, na verdade, a tendência dela é de que ela se torne a própria economia. Então, o que se vai fazer aqui, disse a OCDE, é fazer com que o plano de ação 1 converse com todos os outros demais planos de ação.
Então, por exemplo, o plano de ação relativo ao estabelecimento permanente. Começou-se a criar regras que impediriam ou dariam ênfase maior a determinados itens de configuração desse estabelecimento permanente. Então, em determinadas situações, o fato de eu ter um armazém em um determinado país, isso já seria suficiente para configurar um estabelecimento permanente se aquela atividade, para aquela economia especificamente, não fosse ória. E assim foi feito com vários outros aspectos que o tempo não me permite me estender por mais tempo no exame disso aqui.
Isso foi implementado, teve um relatório inicial em 2013, depois um relatório final em 2015, e em 2018 houve esse “Interim Report”, em que eles examinaram em que situação, uma espécie de acompanhamento da implementação do Action One. E o que se verificou é que, “olha, nós não temos ainda como examinar, isso ainda está em fase de implementação”, mas essas regras, por exemplo, eu citei aqui como exemplo a questão do estabelecimento permanente, a que eu acabei de referir. A conclusão foi a de que houve baixa adesão das novas regras relativas a estabelecimento permanente. Ou seja, a solução que foi dada aos países para que eles pudessem de alguma forma tributar as operações realizadas, elas não foram adotadas, porque eles não aderiram a esse instrumento multilateral. Sem essa adesão os seus tratados ficariam sem as regras que seriam relativas a essa matéria.
Esse relatório, ele também retratou o que ocorria nos demais países. Medidas unilaterais que foram tomadas. Porque os países não ficaram inertes em relação ao fato de que o Action One não produziu o efeito que era necessário. Então o que se verificou foi que determinados critérios aram a ser utilizados para atrair a tributação para os territórios de determinados países. Então se criou a presença econômica significativa, com definições que eram relativas à quantidade de contratos assinados, de volumes financeiros que circulavam pelas empresas no território desses países, isso foi adotado por Israel e Índia. Criou-se o estabelecimento permanente de serviço virtual na Arábia Saudita e outras medidas de mesmo gênero em outros países. Eu vou voltar nesse assunto em alguns segundos.
Outra medida: tributação na fonte, essa já é adotada por nós. Essa já é adotada por nós. E o retorno do turnover tax, a tributação sobre receitas, isso foi feito pela equilization levy, pela índia – que acabou de sofrer, aliás, uma reforma, que ou aliás por maus pedaços.
O equalization levy era uma forma de compensação, ou seja, se a tributação está ocorrendo toda no exterior, a índia criou um tributo que incide sobre o faturamento (alíquota de 6%) sobre todas as receitas de anúncios publicitários online. É uma forma de equalizar a tributação externa com a tributação interna. Há aqui, na verdade, em decorrência da aplicação desses regimes, a possibilidade de bitributação. Porque os tratados permitem a compensação no imposto de renda, isso não é imposto de renda.
A comissão europeia, basicamente, resultou, das reuniões feitas no seu âmbito, duas propostas. Uma de curto prazo, muito semelhante à da OCDE, que era a criação do turnover tax provisório sobre essas receitas decorrentes dessas atividades da GAFAM. E uma segunda proposta que era a criação da presença tributária digital, muito semelhante à OCDE.
Acontece que, dezembro de 2018, essas propostas, apesar de terem sido aprovadas pelo parlamento europeu, não houve unanimidade necessária a que elas fossem implementadas. Não houve unanimidade no Conselho Europeu, e essas propostas foram abandonadas.
E daí surgiu outras iniciativas de implementação unilateral de um imposto digital provisório, todos incidentes sobre receita, pela França, Espanha, Reino Unido, Polônia, República Tcheca, Áustria e outros.
Em junho do ano ado, em Fukuoka, nós tivemos a reunião do G20. O G20, eles se autodeterminaram o alcance de um acordo que terá que ser obtido até 2020. Houve divergência de entendimentos em relação a todos os critérios que foram discutidos pelos Estados de como alocar receitas em relação a um país fonte ou país de residência, aqueles que tem algum tipo de intervenção nessas atividades.
Criou-se, então, dois pilares para a discussão desse acordo que vai ser obtido até 2020, necessariamente. Primeiro pilar: revisar os elementos de conexão, de alocação de lucros. E o segundo pilar é reforçar o BEPS, ou seja, criar um BEPS dentro do BEPS. De forma que novas medidas de garantia de anti-erosão da base tributária sejam tomadas.
Aí um repórter perguntou ao José Ángel Gurría o que ele achava, se era efetivamente inevitável a criação desse imposto que determinasse uma tributação mínima sobre as receitas de tributação decorrentes das novas tecnologias. Vejam o que ele respondeu: “A única coisa inevitável é a morte e os impostos. A questão aqui é quais impostos, quantos e como cobrar”.
Eu acho que essa frase mostra o estado de absoluta perplexidade e de ausência de compreensão do que fazer, isso aqui tributação da renda especificamente, no que diz respeito à economia digital. Então nós temos uma perplexidade nacional e uma perplexidade internacional diante das novas tecnologias.
No Brasil, o que nós temos? Esse é o último slide. Nós temos um momento único que nós vivemos. Eu nunca vi reforma tributária, eu acompanho de perto desde 1995, aliás, foi quando eu tive o imenso prazer de conhecer o professor Everardo. Eu acompanho os projetos de reforma.
[Relatando encontro com Everardo Maciel.] Eu cheguei, era uma reunião de final de semana, estava a equipe econômica, da qual fazia parte o Everardo Maciel, o ministro Malan, o ministro Tourinho, né? Tinha a comissão que representava, a comissão do Congresso Nacional, que era o Mussa Demes. Lembra, aquela, lá trás, a comissão de reforma? Era o Aleluia, o Aleluia estava nessa reunião. Rigotto, Rigotto que virou governador do Rio Grande do Sul, ele era dentista e conhecia bem a matéria. E do outro lado estava, era uma reunião composta de três partes: 7 estados do Nordeste, e eu assessorava o secretário Edmilton Santos do governo Tasso Jereissati, eu estava ali profissionalmente. Os estados do Nordeste, obviamente, querendo guerra fiscal, e o Estado de São Paulo não querendo guerra fiscal. Então, apresentou-se um projeto de reforma tributária que foi para as mãos do dr. Everardo Maciel.Ele pegou o projeto e começou a ticar item por item, aí virou… ticando, ticando, ticando. Chegou no fim ele tinha ticado quase tudo. Ele falou: “Tudo que eu anotei, que eu risquei aqui, não tem a menor chance de ar”.
Pois bem, eu venho acompanhando os projetos de reforma desde 1995. De alguma forma ou de outra, participando de debates ou indo às comissões do Senado para fazer depoimentos a respeito deles, enfim, eu estudo efetivamente. Parei de estudar porque comecei a confundir o que estava em vigor e o que não estava. Mas o que eu retiro dessa minha experiência é que os projetos de reforma tributária estão amparados num tripé jurídico, econômico e político.
Todos esses projetos, a maior parte deles, pelo menos, caiu porque o lado político não segurou, não foi suficiente para sustentar a estrutura. Nem essa PEC 45, como muito bem demonstrou o professor Hamilton… ela tem um outro e, tem algumas deficiências que tornam quase impossível a sua sustentação, é muito difícil rebater a questão do pacto federativo, a questão da seletividade, alíquota única. Isso causa aumento da carga tributária, principalmente para as sociedades prestadoras de serviços, como foi demonstrado na sua apresentação aqui, de no mínimo 500%.
Na sociedade de dentistas, para não dizer de advogados, que esteja no lucro presumido e que pague 3,65% de PIS e Cofins, vai ter um aumento para 25%. Se vier então a malfadada tributação dos dividendos, vamos recolher o bonde e sair do país. Porque não tem a menor condição.
Bom, nós temos a proposta do IVA federal. Ou seja, a criação, que é a proposta feita pelo governo, que é a criação de um IVA que aglutine IPI, PIS e Cofins. Eu tenho sérias dúvidas sobre a constitucionalidade dessa proposta, porque hoje em dia nós temos o faturamento sendo tributado por duas contribuições: PIS e Cofins. E a tributação do IPI sobre produtos industrializados.
O ICMS e o ISS, eles incidem sobre o valor da operação. Faturamento nada mais é do que o somatório de todos os valores das operações realizadas num determinado período. E a Constituição diz que a competência residual só poderá ser exercida se for instituída por lei complementar, houver previsão de não cumulatividade em relação à nova legislação e a nova legislação não tiver base de cálculo ou fatos geradores próprios de outro imposto. Não idênticos, próprios. E faturamento, a meu ver, é próprio de ICMS e ISS.
E se fizermos isso por PEC? É cláusula pétrea essa regra? Parte da doutrina diz que é. Eu tenho dúvidas a respeito da constitucionalidade na medida em que se transformará duas contribuições em um imposto. As contribuições, elas podem ter essa base de cálculo ou fato gerador próprios de outro imposto, mas outro imposto não. Isso é uma mera reflexão.
Tributação sobre as movimentações financeiras, do nosso querido secretário Marcos Cintra. As movimentações financeiras talvez sejam a forma de solucionar as novas tecnologias. Os senhores vejam que essa é a alternativa que está sendo adotada pelos outros países. Turnover tax, enfim, eles sempre tentam pegar o fluxo financeiro.
Porque com as novas tecnologias eu mudo o provedor dos serviços e das mercadorias, eu mudo o receptor desses serviços e dessas mercadorias. Eles se movem no mundo. Eu não consigo captar, definir um estado que seja competente para tributá-las, mas o fluxo financeiro continua saindo do bolso do comprador e indo para o bolso do vendedor. Então, talvez essa seja uma solução para as novas tecnologias.
Até o momento em que a criptomoeda estiver funcionando. Porque a partir do momento em que ela funcionar de fato e estiver legalizada, aí não se define mais quem é vendedor e nem quem é comprador.
Alterações pontuais no sistema vigente, ou seja, uma quarta opção. Que é o seguinte: vamos identificar os problemas e arrumar as soluções para os problemas específico, num ambiente infraconstitucional. Vamos pegar a não cumulatividade do ICMS, do IPI, do PIS e Cofins e vamos tentar resolver esses assuntos. Vamos tentar resolver a questão dos benefícios fiscais de uma forma infraconstitucional, sem mexer na Constituição. Essa é uma quarta alternativa.
E uma quinta alternativa, que eu escutei ontem em uma reunião que eu participei, do dr. Alberto Macedo, que é procurador do município, que eu achei interessante, que seria mesclar essa alternativa (d), que em um momento anterior, ou seja, acertar de forma, as regras que sejam infraconstitucionais e que possam, de alguma forma, prejudicar a relação Estado/contribuinte e, feito isso, aí sim tentar migrar para a (a). Ou seja, criar um IVA efetivo.
Eu não sou contra o IVA, não sou. Pelo contrário, eu sou favorável. Apesar de ser um tributo do século ado, um tributo ultraado, um tributo que também necessita de vários e vários ajustes em relação às novas tecnologias, não é um tributo que seja suficiente para tributar essa circulação de riquezas, tanto é que tem o MOSS, o Mini One Stop Shop, que tenta concentrar em determinados países o recolhimento de tributos que devem ser feito às várias jurisdições para as quais as vendas são feitas, mas eu acho que, em função do fato de ser esse o tributo que está em vigor em outros 165 países, nós não podemos estar de fora disso.
O investidor, repito o Schoueri ontem, o investidor não gosta disso. Então, essas são… A previsão para o Século XXI é que é uma completa impossibilidade de se dizer algo que seja posterior ao meio-dia de amanhã.
Muito obrigado.
Questão de Everardo Maciel para Gustavo Brigagão:
EVERARDO MACIEL: Primeiramente, agradecer ao Gustavo pela brilhante, porém, não surpreendente exposição, e acho que para mostrar para todos vocês que nós tivemos uma tarde excepcional ouvindo cinco dos mais brilhantes juristas tributaristas brasileiros em uma combinação também interessantes, cada um abordando aspectos bem diferentes, mas todos tendo como convergência a questão da segurança jurídica.
Umas pequeníssimas ponderações. O Secretário-Geral da OCDE, ao fazer aquele comentário, ele devia pagar crédito a Benjamin Franklin, que a base não é dele não, era do Benjamin Franklin. Ele estava assumindo como se fosse dele.
O que eu acho que eu acrescentaria é o seguinte: era a morte dos impostos. Vocês imaginem. Nós estamos com um grau de confusão desse gênero no mundo. Isso é absolutamente verdadeiro. Não é verdadeiro porque o tributo ficou ruim. É que o mundo mudou.
Há uma mudança espetacular no mundo. Quer dizer, nós estamos hoje lidando com, para usarmos algumas frases de um autor que eu e o Hamilton gostamos muito, que é o Harari, Yuval Harari, nós estamos lidando com mercadores de atenção, onde você não está obtendo informação, você é o produto. Isso é uma mudança absolutamente incrível no mundo. Então essa mudança incrível no mundo implica dizer, portanto, que os sistemas tributários têm que ser repensados completamente. O que existe é uma grande perplexidade. Quer dizer, tudo o que se ouviu falar de BEPS, de OCDE, de União Europeia, na verdade é que ninguém está conseguindo encontrar uma solução porque o problema sequer está formulado adequadamente. Porque não se compreendeu claramente que uma grande mudança está se operando no mundo.
Essa é que é a questão central. E veja bem, você não abordou, certamente porque não haveria tanto tempo, quer dizer, até das soluções que estão sendo adotadas nos Estados Unidos. A adoção de alguns novos tributos, como o BIT como o GUILT, quer dizer, buscando inclusive algumas soluções que eram nossas. Você ouviu ontem o Isaías dizendo: “Olha, agora os americanos estão adotando as soluções que o Everardo colocou aqui no Brasil, quer dizer, há muito tempo atrás”.
Não é isso. É que existe rigorosamente uma enorme perplexidade e então quando eu falo do IVA e, como nós já conversamos, o IVA é de 1949, quer dizer, originariamente do Japão. E com um detalhe, não era crédito, imposto contra imposto, era base contra base.
Era um modelo, portanto, completamente diferente. Há um livro que eu acho excepcional que lida sobre isso, que é o livro da Clara Sullivan, que eu acho que talvez onde tenha o melhor histórico de tudo o que existiu no IVA ao longo do mundo.
O que eu entendo é o seguinte: nós estamos discutindo a solução de 49 para o Século XXI. Que existe um problema é óbvio que existe. Todos aqui apontaram muitos e eu acrescentaria até alguns outros que não foram apontados aqui, mas nem é o caso. Hoje eu não sou expositor. Mas claro que existem problemas.
Agora, o que eu acho que tem de tratar é o seguinte. Vamos ver como é que nós resolvemos esses problemas, enquanto isso olhar o que que está acontecendo no mundo para buscar uma solução, não como estamos pensando aqui, mas como fizemos em 65. O que que fizemos em 65? Quando apareceu o IVA, o Brasil saiu como pioneiro. Quer dizer, depois da solução do Japão que foi extinta e a França adotou, a primeira solução de um IVA inteiro foi Brasil. Porque a França não tinha IVA até a ponta final do varejo, não. A França interrompia.
Quer dizer, isso foi solução ousada, foi solução avançada para um mundo de cadeia produtiva. Não tem mais cadeia produtiva. Você tem rede. Então buscar, portanto, uma solução de cadeia produtiva quando tem rede? Você citou exemplos aqui da Nutella, é aquilo. Quando nós estamos falando em impressão 3D, você é produtor ou consumidor? Definitivamente, você vai ter que sortear para dizer o que que é. Ou são as duas coisas.
Mas, enfim, dizer o seguinte: Gustavo, eu quero é cumprimentá-lo, foi uma exposição brilhante. Eu acho que aqui tem elementos bem interessantes para nossa reflexão e isto terminar integrando um livro, como você já deve saber, é importante, tudo isso servirá para que nós possamos ter algo, algum legado para que as outras pessoas possam também ver.
E ao fazer isso, antes de encerrar, e eu vou pedir para encerrar, eu ia pedir ao dr. Victorio De Marchi fizesse, eu o a palavra para você.
GUSTAVO BRIGAGÃO: Em relação à questão da participação dos consumidores nas relações que se estabelecem com as empresas relacionadas à economia digital, uma das questões que foram discutidas, tanto na OCDE quanto no G20, quanto na União Europeia, é de se atribuir valor aos dados que são fornecidos, porque quando nós entramos em um WhatsApp, por exemplo, nós não pagamos nada para usar o aplicativo, mas nós somos obrigados a fornecer dados nossos, e esses nossos dados são utilizados por ele e agregam valor à empresa e que, na verdade, essa matéria-prima que nós damos, também gratuitamente, há uma espécie de permuta, essa matéria-prima é que faz com que essas empresas faturem aquela cifra.
Então, eles estão querendo dizer o seguinte: “Olha, há tributação aqui sim”. O fato de haver a utilização de consumidores do WhatsApp. Entendeu. Então, chega a esse nível de discussão e isso aí pode evoluir para isso mesmo e acabar sendo, haver tributação em função dessa interpretação.
Agora, em ralação ao IVA, eu concordo, é um tributo da metade do século ado, é um tributo que foi criado também para uma realidade completamente diferente da atual, mas nós estamos atrás disso.
Eu não considero que a criação do IPI, do ICMS (do ICM ainda) ou do ISS tenha sido algo, a não ser por esse aspecto que se vai até o varejo, que é um aprimoramento, mas eu não considero que eles sejam tributos não-cumulativos. Esse é que é o meu ponto.
EVERARDO MACIEL: Mas se me permite fazer uma ponderação. Uma certa ocasião o Paulo Ayres Barreto nos contava que perguntavam ao nosso querido e saudoso Alcides Jorge Costa: “O senhor é a favor de tributo cumulativo ou não-cumulativo?” E ele, com aquela sabedoria que é peculiar dizia: “Depende da alíquota, né? O resto é principismo.”
GUSTAVO BRIGAGÃO: É, mas isso sobre o aspecto de carga tributária que recai. A minha questão é, atrasado ou não, o fato é que nós temos 168 países que adotam o IVA e nós somos diferentes desses 168 países. Então, acho que isso é um problema no que diz respeito a investimento de capital estrangeiro no país. Entendeu. Então, é por isso que eu acho, quando eu vejo as críticas, eu concordo com todas elas.
Mas eu acho que nós deveríamos eventualmente tentar lutar para tentar de alguma forma contornar isso e criar um IVA, não dessa forma como está sendo criado. Aperfeiçoando um pouco isso, mas eu gostaria muito de poder dizer a investidores estrangeiros que nós temos uma forma de tributação que é compatível com aquilo que eles conhecem. E hoje eu não consigo dizer isso, entendeu?